top of page

Influência do Punk no Metal nos anos 70 e 80


Para não se confundir com a cronologia, confira também nosso Mapa de Formação dos Estilos e a em outra página a Cronologia de Uso do termo Gótico na Música e Subcultura Gótica.


Na música, visual e comportamento, o metal moderno deve muito às diversas fases do punk. E não só na música, mas nos visuais e comportamentos. Mas o que estamos chamando aqui de “metal moderno” e "metal tradicional"?


O metal tradicional, caracterizado pela malditíssima trindade Black Sabbath, Deep Purple e Led Zeppelin, evoluiu na segunda metade dos anos 60 e começo dos anos 70 a partir de uma base do rock tradicional, com elementos do blues, virtuosismo, e uma atitude e visual mais romântica e rococó, até gótica no sentido pré-subcultura gótica do termo (ouça-se o primeiro Sabbath e isso fica claro, digo, obscuro...).


Já o Punk surge inicialmente nos EUA a partir de uma evolução/regressão mais crua retrô ao rock básico original e do garage rock do final dos anos 60 e início dos anos 70, com bandas como MC5 e The Stooges (aprox. 1967-1972). Esse era ainda o punk apolítico, urbanóide, niilista e hedonista, que se opunha ao romantismo, paz e amor e preocupações políticas dos hippies que combatiam a guerra do Vietnã e incorporavam o “paz e amor” à natureza e culturas orientais. MC5 – Kick Out The Jams (1969)

Stooges – Raw Power (1973) Iggy Pop Mix

Depois do termo punk aparecer várias vezes na mídia musical norte americana entre 1971 e 1974, ele se consolida com o Zine Punk e a cena CBGC, estourando pós new York Dolls com a turma do Ramones.

Mas um espertinho empresário Inglês (Malcolm McLaren) leva a ideia pra Londres no ano seguinte e essa parte da história vocês conhecem: o punk 77 como um fenômeno midiático comercial na Inglaterra, com The Damned, Sex Pistols e The Clash. Posteriormente, com o fim dessa moda inicial, surge a subcultura Punk, como a conhecemos, que leva a sério sua proposta política, etc. Em menos de 10 anos, uma mudança radical no conceito de punk, mas mais estava por vir.


Enquanto o post-punk retomava as influências pré-punk erradicadas pelo ódio e fúria de 1977 (a black-music, funk, soul, jazz, blues- o krautrock, o aspecto temático do glam-rock, música étnica do mundo todo, e reggae, dub, folk music, etc) uma nova geração punk entrava nos anos 80 radicalizando o som e atitude. Diferente dos punks de até 1977, agora o visual era de moicanos e variantes, coturnos, jaquetas com rebites, coturnos e o pogo era a lei. Novas bandas no início dos anos 80 evoluiram para o punk-hardcore.


Antes, ainda nos anos 70, artistas como Motorhead fundiram elementos de Ramones e Stooges em um novo metal, mais rápido, cru e mais agressivo. A atitude romântica e rococó (pelo menos nas letras e álbuns) da trindade Sabbath-Purple-Led começa a soar datada, ainda que imortal).


Quando Lemmy formou o Motorhead em 1975 ele já estava na estrada há 10 anos, tendo passado pelos vanguardistas Hawkwind na primeira metade da década. O álbum de estreia de 1977 “Motorhead” já na faixa título apontava para um futuro em que a fronteira entre punk e metal se torna uma twilight zone. O álbum seguinte de 1979. “Overkill” sacramenta o caminho, como se Ramones e Black Sabbath os tivessem parido em um trem desgovernado.


Motorhead- Motorhead (1977)

Motorhead- Overkill (1981)


Lemmy do Motorhead (à direita) tocando com a galera do The Damned

Para exemplificar a proximidade, em 1977 Lemmy até tocou com o The Damned, além de andar por aí com Gaye Advert, do the Adverts e se tornar brother do tio Joey Ramone, além de tentar ensinar o Sid Vicious a tocar baixo, invejosos dirão que sem sucesso... rs


Rola o tempo, passa o tempo, em 1982 a banda Discharge, formada em 1977, lança o álbum “Hear Nothing See Nothing Say Nothing” que criou um som baseado no “D-beat”, uma batida de bateria alarmante acompanhada por instrumental e vocais idem, e temas apoca-políticos que se tornou referência de uma nova geração de bandas punk e metal ao mesmo tempo.

DISCHARGE- Hear Nothing See Nothing Say Nothing (1982):

https://open.spotify.com/album/6WYcRCX40Kfhjjeiy2S91P Bandas como Metallica, Sepultura, Anthrax e outras pagaram seu tributo ao Discharge homenageando a banda em diversos covers.

Também com a NWOBHM (a pior sigla da história, significando New Wave Of British Heavy Metal) no começo dos anos 80, a batida e atitudes punks são incorporadas ao metal. É muito interessante este site "mapa do metal" que ilustra as ramificações entre os estilos e com exemplos musicais. Da Ilha do Punk e Hardcore-Punk podemos seguir as trilhas para a primeira onda do Black Metal e para a NWOBHM. https://mapofmetal.com/

Na Europa surgiam Venom, Hellhammer, Sodom, Tormentor (pré-Kreator). Nos EUA, bandas como Metallica e Slayer. Posteriormente o Slayer até homenageou suas influências punk e hardcore em um álbum de covers:


Como destaca o escriba do blog The Atmosphere, Bruno Rocha: "As influências punk nas bandas da NWOBHM se manifestaram mais notadamente em duas bandas: no próprio Iron Maiden, cujos dois primeiros discos tem nítidas influências de Punk, principalmente nos vocais e nas atitudes do então vocalista Paul Di'anno, mas também nos arranjos das músicas e principalmente na banda Venom - que é considerada por muitos como a criadora do Black Metal, o que eu discordo. O Venom pegou as influências do Punk e do Motörhead e fez aquele Metal típico da NWOBHM soar bastante cru e agressivo."

No Brasil, ouvindo a discografia de bandas como Sepultura e Ratos de Porão desde o começo, essa relação fica bem clara.



O novo som misturando punk, hardcore e metal casa perfeitamente com o resto do enredo. A influência punk e hardcore nos comportamentos, dança e outras e formas de sociabilização é notória em vários subestilos do metal moderno, por exemplo com o pogo, mosh, stage diving ou roda punk / “ciranda punk” nos shows ou pistas de metal.


O visual do metal também deixou o aspecto romântico, vitoriano ou hippie do começo dos anos 70 para um visual mais rústico em que jaquetas rasgadas com patches e coturnos são comuns, entre outros adereços. Já em outros estilos e subculturas do assim chamado "pós-punk" vemos formas de sociabilização, dança e ocupação de espaços socias por gênero completamente diferentes do punk e do metal. Sobre esse assunto é interessante também esse artigo de Manuel Soares.


MITOS BRASILEIROS


Aqui em Pindorama (Brasil) todas essas fases e contra fases chegam depois embaralhadas e fora de contexto, o que dá origem a uma série de mitos e mal-entendidos até hoje.


Por exemplo:

1) o fato de o metal tradicional (1968-1974...) ainda ser popular quando o punk 77 se populariza aqui anos 80 criam o mito e que o punk não influenciou o novo metal, que já existia época.

2) o fato do hippie e metal tradicional terem durado muito no Brasil, devido à ditadura, e o Glam Rock ter ficado muito restrito devido ao conservadorismo e machismo latino da sociedade brasileira, fez o post-punk/new wave chegarem tarde como algo “sem origens” e misturado ao punk, criando o mito de que tudo derivava do punk 77.

ENQUANTO ISSO, NA FRONTEIRA DO PUNK COM O POST PUNK E GÓTICO ...


Há "500" motivos históricos pelos quais a subcultura gótica é anti-fascista, baseados nas características subculturais do gótico, mas ter derivado do punk ou anarco-punk não é um deles. Simultaneamente a essa convergência do punk/hardcore com o novo metal, no comecinho dos anos 1980, o post-punk/new wave e Goth se definiam por oposição a esses desenvolvimentos do punk e metal:


"De fato, nos seus dias iniciais, o Gótico foi formado como reação contra outras duas vertentes que surgiram diretamente punk - Oi! e anarcho-punk - ambos engajados com exploração e injustiça. De 1980 em frente, havia existido uma resurgência "punk is not dead", os charts independentes transbordando com novos nomes como Vice Squad, Discharge, Anti-Pasti, Flux of Pink Indians, Zounds, GBH, Chron-Gen, Rudimentary Peni e outros. O OI! e o "real punk" definiram o punk como protestos militantes ancorados na experiência da classe trabalhadora. Focados na banda/selo Crass em uma fazenda comunal, o movimento anarcho-punk era mais ideológico e idealista, vomitando tratados em vinil que denunciavam a trindade profana do estado/igreja/militares, enquanto exaltavam o pacifismo e autogoverno." (Reynolds, Simon. Rip it Up and Start Again: Postpunk 1978-1984 (p. 424). Faber & Faber.)


Traduzindo: punk dos anos 80 tinha características muito diferentes daquele de 1976 londrino e, se viagem no tempo fosse possível, punks dos anos 80 vomitariam em cima de “posers” pedantes e “burgueses” como o Bromley Contingent de 1976... (que em última análise realmente eram posers no sentido positivo do termo, como filhos Camp e Dandis de Wilde, Bowie e Warhol... no polo oposto a postura “real” que o Punk e o Metal seguiriam nesse futuro dos anos 80...). Mas considerar algum sentido de "poser" positivo só é possível no planeta Gótico/NewRomantic/Glam, que fica no sistema solar "Bowie" em uma galáxia muito, muito distante desse novo real punk anos 80.


Os anos 90 já são outro capítulo... pelo menos para o metal. Mas sem spoilers hoje.


Assim, se formos aderir a uma formulação irônica e sarcástica, o metal moderno seria “post-punk” 😊.

Sendo menos engraçadinhos nos cabe tentar entender o passado e o presente e desfazer esses mitos. Basta ouvir as músicas e identificar os comportamentos . Está tudo lá.


Henrique A. Kipper (2023)

Agradecimentos pelas conversas sobre os assunto com os amigos

Bruno Rocha, do The Atmosphere https://blogtheatmosphere.wordpress.com/ e Rodrigo, do Historia e Metal https://historiaemetal.blogspot.com/


bottom of page